Tranqueira de Díli
Tranqueira de Díli

A historia da Tranqueira de Díli, (Timor-Leste)

Por: Juan Carlos Rey (Asociacion Española de Estudios del Pacifico)

A capital do território colonial português de Timor mudou de Lifao, em no territorio de Oecussi, para Díli no ano 1769. Naquela altura, Díli era uma pequena aldeia com casas de barro e palapa com telhados de folhas de palmeira e “talimatan” (nome, em lingua tetúm, da palha local de cor preta) como as que ainda hoje existem nas áreas rurais do pais. Um trabalho intitulado “As Possessões Portuguesas na Oceânia – Descrição da Praca de Dili”, do autor José Joaquim de Sousa, faz a seguinte descrição da praça em no ano 1800: “ A praça é um terreno cercado de palapas…… dentro d’este cerco, da parte do mar, esta a Tranqueira, cujas muralhas são de pedra solta bruta, posta uma sobre a outra, a face que cae para o mar tem dois muros da mesma qualidade, distante um do outro entre elles um entulho de terra e pedra, e onde estão as peças muito velhas e differentes calibres”.
Por decreto de Setembro de 1865 a praça de Díli foi elevada à categoria de cidade, e naquela mesma altura, na zona costeira as construções também se limitavam a uma Igreja, a casa do administrador (bungalow), o edifício da alfândega e uma fortaleza de barro e madeira, chamada Tranqueira o Fortaleza de Nossa Senhora da Conceição.

O centro desta incipiente cidade era onde agora se encontra o Palacio de Governo (só erigido em 1960) e a frente tenha um pequeno cais de desembarque para descarregar os navios ancorados em frente, onde havia uma bateria de costa para defesa da posição, que ainda hoje se conserva o lugar com antigos canhões olhando o horizonte.

Bateria de costa, Díli. Foto JC REY

Bateria de costa, Díli. Foto JC REY

Numa ilustração, quase de criança, em perpectiva da baía de Díli, desenhada pelo tenente Botelho, da Armada Real, aparece a mencionada fortaleza da Tranqueira, assim como outras edificações próximas, como uma igreja, a alfândega e a feitoria do navio que fazia a ligação com Macau. A estampa mostra a Tranqueira com un muro de pedras e, no interior, uma esplanada avançada para leste onde se encontrava o mastro da bandeira portuguesa da época. Uma bateria de canhões a pontava para o mar, dando proteção ao ancoradouro. A residência do Governador estava na parte interna interna do reciento da Tranqueira. No mesmo desenho podem ser vistas algumas casas para leste, onde hoje está a Secretaria de Estado da Juventude e Desporto, bem como o “ilhote de Pedra” que ainda presentemente se distingue frente à atual resindência do obispo de Díli.

Tranqueira de Díli

Tranqueira de Díli

O incansável naturalista inglês Wallace Russel, que viajou durante mais de nove anos (1854-1862) pela região dio sudeste asiático e visitou “Delli” – a capital das possessões portuguesas do nordeste em 1861 – faz uma descripção da praça no seu livro “Viajem pelo Arquipelago malayo”, em que diz: “O seu forte é um simple recinto de terra endurecida”.
Asim a primeira fortaleza propiamente dita, construida em Díli em 1769, foi chamada Tranqueira, que conheceu importantes modificações com o passagem do tempo. Uma nova descrição da praça de Díli, feita por Affonso de Castro em 1861, e publicada em 1865 na Gazeta das Fábricas, volume II pagina 119 : “À direita està a casa que serve de alfândega e à esquerda (mirando do parte do mar) està a fortaleza, ou Tranqueira, com as suas onze velhas peças montadas sobre bases que se estão a desfazer. Não se á porém imaginar que a tal Tranqueira tem alguma coisa de forte. Não, a Tranqueira não passa de ser um grande rectângulo, com três faces de muralha de pedra solta e a quarta que olha para o mar, é um terrapleno sem revestimento, sobre o qual estão collocadas as peças sem deffeza de qualidade alguma e inteiramente a descoberto”.

Cem anos depois do inicio da construção da primeira Tranqueira e no mesmo lugar, a fortaleza mudou-se no Quartel de Infanteria em 1869, depois em Quartel de Artilleria e finalmente em 1960’s mudou para Quartel de Intendencia. A Tranqueira apresentava então uma planta melhorada, de acordo com uma verdadeira fortaleza em comparação com ao desenho do feito à mao pelo 1º tenente da Armada Botelho 74 anos antes. O quartel de Infanteria tem semelhança com outros edificios militares portugueses nos territórios do ultramar construidos na segunda parte do século XIX.

O primeiro mapa em que se pode apreciar a recente construçao de antigo quartel data de 1870 e a planta do edificio é exactamente a que é na actualidade o mesmo predio. Francisco Sousa Lobo, que trabalhou como perito da UNESCO diz que se trata de “um edificio de arquitectura neoclasica, muito sóbrio e de grande disgnidade”.

Tranqueira de Díli, 1843

Tranqueira de Díli, 1843

Plano do porto e cidade de Díli. Mapa Andrea e Machado 1870

Plano do porto e cidade de Díli. Mapa Andrea e Machado 1870

Plano da cidade de Díli. Mapa 1895

Plano da cidade de Díli. Mapa 1895

Planta do antigo Quartel de infantaria de Díli, 1895

Planta do antigo Quartel de infantaria de Díli, 1895

Quartel de infantaria de Díli. Mapa 1910

Quartel de infantaria de Díli. Mapa 1910

Durante a II Guerra Mundial, a ilha de Timor foi ocupada pelos japoneses, e a maior parte de Díli foi destruida por bombardeamentos aliados mais miraculosamente nenhuma bomba caiu no Quartel de Infanteria. Apesar de que alguns impactes foram muito próximos, no mar, a escassamente 100 metros do edificio. Uma fotografia aérea do 02-11-1942 (Australia War Memorial negatif nº 128133) mostra os impactes e explosões na baía de Díli. O edificio saiu incólume da contenda o mesmo que acontecio com o Pálacio de Lahane, as duas construções coloniais mais antigas que subsistem em Díli.

Díli durante a Secunda Guerra Mundial

Díli durante a Secunda Guerra Mundial

Quartel intendencia de Díli. 1930

Quartel intendencia de Díli. 1930

Quartel de Intendencia Entrada pela avenida Sá de Bandeira. 1964

Quartel de Intendencia Entrada pela avenida Sá de Bandeira. 1964

Durante a época da ocupação Indonesia (1975-1999), a antiga fortaleza da Tranqueira convertido em edificio do quartel de Infanteria portuguesa, foi utilizado pelos militares indonesios e mais precisamente pela companhia nº 1627. Para muitos timorenses o edificio ficou com a sinistra memoria de centro de internamento e interrogatórios do sistema repressivo militar dos ocupantes indonesios.

Quartel de Infanteria portuguesa, utilizado pelos militares indonesios e mais precisamente pela companhia nº 1627. Foto JC Rey

Quartel de Infanteria portuguesa, utilizado pelos militares indonesios e mais precisamente pela companhia nº 1627. Foto JC Rey

A saída da Indonesia em 1999, na esteira da Consulta popular o referendo da independência, deixou uma maré de destruição nas infraestructuras de Timor-Leste, nomeadamente o edificio do antigo quartel foi incendiado propositadamente pelas milicias indonesias. O fogo quimou o tecto, mas por sorte a madeira da época resistiu; a parte baixa fico menos danificada do que as partes superiores dos muros. O fogo destruiu as portas e janelas, escapando intacta apenas uma que seria utilizada como mostra para a reprodução das restantes na renovação do prédio entre 1999 e 2002.

Quartel de Infanteria portuguesa. Foto Gertil

Quartel de Infanteria portuguesa. Foto Gertil

Com a resolucão 1272 do Conselho de Segurança das Naçoes Unidas foi criada a Administração Transitória da ONU em Timor-Leste (UNTAET, siglas em inglês) que teve entre as suas tarefas a preparação das bases da nova nação. Uma das atividades foi a reconstrução de algumas infra-estruturas básicas. Criou-se a Trust Fund for East Timor (TFET) en Dezembro de 1999 em Tóquio, Japão, com contribuições dos parceiros: Japão, Australia, USA, Portugal, Uniaão Europeia, agências da ONU, Banco Mundial e ADB. Estes dois últimos ficarom com a gestão do fundo.

O projecto de reconstrução integrou-se no programa Community Empowerment Projet, com o alvo de renovação do antigo quartel como futura Uma Fukum o casa do Povo, en língua Tetum, para albergar o Centro da Cultura Nacional o Museu Nacional, e também, uma galeria de arte. O projecto de reconstruçao da Casa do Povo com uma área de 2.443 metros quadrados foi gerido pelo Banco Mundial, com a colaboraçao da UNESCO e do grupo de engenharia Gertil, com um orçamento de 0,8 milhões de dólares americanos.

Como descrito num artigo de ingenheiro Francisco Sousa Lobo (De Pedra & Cal n° 15 Julho/septembro 2002): “ O edificio actual foi feito em alverania de pedra muito diversa, rebocado com argamasa de cal e areia, e decorado com frisos e nervuras feitas em tijolo cozido, também revestido com argamasa. Nas paredes há elementos en calcáreo, basalto, xistos e pedras de coral das mas variadas formas e dimensões. As fundações do quartel foram justapostas à segunda versão da fortaleza com mão de mestre, para que o esforço de construcão fosse muitro reduzido. A mas plausível conclução é a de que a maioria do material de construção foi proveniente da antiga Tranqueira “. Mais à frente, diz que: “ a dimensão e forma desta praça serviram de matriz à cidade de Díli, e determinaram o alinhamento das ruas e o tamanho dos quarteirões, na grande remodelação que foi feita por volta de 1840”.

O grupo de engenharia portugês Gertil, entre 1999 e 2002 efectuou um studo muito completo da desastrosa situação em que ficou o antigo edificio. O estudo mostrou que caixilhos originais das janelas eram de madeira de palmeira e que as cores das paredes mudaram com as épocas do banco ao azul. Foi interessante constatar que o edificio do quartel foi cosntruido com un muro duplo, deixando entre o primeiro e o segundo muro uma câmara-de-ar para refrigeração da parte interna. Uma série de aberturas circulares, que ainda existem na actualidade, ventilavan a parte do telhado.

A exposiçao intitulada “Historia da Uma Fukum e a Cidade de Díli” realizada a 15 de maio de 2002 pela UNESCO, com a participação do Instituto Camõens e da Associação Portuguesa dos Amigos dos Castelos, mostrou documentos e fotografias interessantes da história do edificio atual, designadamente uma de 1870 com grandes árvores na actual Avenida Nicolas Lobato (antiga rua do Commercio).

Díli, Rua do Commercio em 1870

Díli, Rua do Commercio em 1870

O projecto de reconstrução empreendido com fundos geridos pelo Banco Mundial nunca foi acabado e as obras seriam suspensas en Agosto de 2002 por falta de fundos.

Em 2002, o edifício parcialmente restaurado, foi entregado ao recém-criado Governo de Timor-Leste, ficando infelizmente sem qualqer segurança e protecção. Un relatorio da UNESCO (Final Report. UNESCO. Timor Leste Cultural Heritage Conservation project. Project Code 217GLO4070 december 2006) diz: “If the building is not put in use immediately, the project of Cultural Center is in risk”. Esta frase do perito Francisco Sousa Lobo foi uma premonição do que aconteceu depois. Entre a 2003 e os acontecimentos trágicos de 2006 o edificio ficou ao abandono e tudo o que era de roubar, foi roubado: portas, janelas e portadas, cabos eléctricos, canalizações, etc…. .
En 2007 o Banco Nacional Ultramarino desevolveu um projecto para uma mediateca, destinada aos jovens, com aulas de informática e biblioteca, mas nunca viu a luz do dia porque o 24 de Novembro desse mismo ano o edificio, en forte estado de deterioração, seria entregue pelo Governo de Timor-Leste à Comissão Europeia para ser a sede diplomática da Delegação da União Europeia em Timor-Leste. Depois de um ano o edificio foi renovado completamente com a preservação e uma visão fiel do seu estado original do antigo quartel e inagurado com una nova vida a 24 de Novembro do 2008, como uma contribução para a preservação do patrimonio colonial de Timor-Leste, depois de umos 240 anos da construção da Tranqueira original de Dili.

Outras referenças:
1) A estoration and rehabilitation of the oldest building in Dili / Francisco Sousa Lobo. -Timor: [s.n.],2000. – 18, 30, [9] p.
2) Reconstruction Survey, Timor Leste 2007. Report Authors : Joao Saldanha; Marcelino Magno; Anacleto Ribeiro; Edmundo Viegas. Timor Institute of Development Studies. 2007.
3) 1er encontro international patrimonio mundial da oriegen portuguesa, abril 2006, Rui Brito de Fonseca.

Copyright: Juan Carlos Rey

About Marco Ramerini

I am passionate about history, especially the history of geographical explorations and colonialism.